O objetivo desta tese é compreender como a reprodução das interseccionalidades de marcadores sociais das diferenças, em suas diferentes faces, são mediadas pelas relações de poder estabelecidas entre as mulheres associadas à organização regional Café Mulher. Para alcançá-lo, recorremos ao entrelaçamento teórico-metodológico das abordagens pós-colonial, interseccional e dos marcadores sociais das diferenças. O material empírico reunido para a análise envolveu entrevistas narrativas com oito mulheres heterogêneas, associadas à organização regional Café Mulher, da Região Sul de Minas Gerais, e a pesquisa documental. Esse material foi analisado por meio da Análise Temática de Conteúdo e do uso das lentes de análise da abordagem pós-colonial e a interseccionalidade dos marcadores sociais das diferenças. Três categorias de análise emergiram: quem são as mulheres associadas à organização regional Café Mulher; o contexto da referida organização e as relações de poder entre as mulheres associadas. Os resultados nos levam a interpretar que as mulheres associadas à Café Mulher são mulheres heterogêneas, contrariando o conceito universal de “mulher”. São mulheres de diferentes cores, profissões, como cafeicultoras, catadeiras, apanhadeiras, meeiras e classes sociais, que estão na cafeicultura de 16 a 50 anos e apresentam um envolvimento familiar e/ou individual muito forte com o café. A partir das intersecções entre os marcadores sociais das diferenças, essas mulheres ocupam diferentes posições no terreno acidentado da organização regional Café Mulher. Souza e Ana, mãe e filha, mulheres negras, pobres, catadeiras e apanhadeiras, nascidas e criadas no Distrito de Lutas, em meio às relações de poder estruturadas ainda no período escravocrata, foram por nós identificadas, entre as entrevistadas, como as associadas que estão no entrecruzamento das vias de opressão do sexismo, racismo e elitismo, sendo atingidas por um fluxo intenso de tráfego que deixa graves marcas. Sobre o contexto da organização regional Café Mulher, foi fundada no Distrito de Lutas, em 2015, por Maria e Auzira Amélia, mulheres brancas, cafeicultoras, proprietárias de suas fazendas e de classe média-alta, com o objetivo de ajudar as catadeiras, apanhadeiras e meeiras do Distrito, porém, não perderam o foco na lógica mercadológica e excludente, na realidade, voltada para as produtoras. Esse objetivo, portanto, foi perdido e a Café Mulher tornou-se um contexto de reproduções. Quando as mulheres negras, que são catadeiras e apanhadeiras começaram a deter o poder, mostrar sua resistência e ter suas vozes ouvidas e presenças conhecidas, as cafeicultoras, sentiram-se incomodadas, afinal feri o pacto narcísico da branquitude. Com a criação da Comercializadora Café Mulher Sul de Minas Gerais, vinculada à Café Mulher, não foi diferente, o foco está nas necessidades de capitalização das produtoras de café. Nesse contexto, prevalece, portanto, a reprodução de relações de poder entre mulheres, mediadas pelos entrecruzamentos de vias de opressões como racismo e elitismo, que, desde o período colonial, buscam manter o poder nas mãos de pessoas brancas, cafeicultoras e proprietárias de suas terras, colocando em condição de subalternidade mulheres negras, pobres, catadeiras e apanhadeiras.
The objective of this thesis is to understand how the reproduction of intersectionalities of social markers of differences, in their different faces, are mediated by power relations established between women associated with the regional organization Café Mulher. To achieve this, we resorted to the theoretical-methodological intertwining of postcolonial, intersectional and social markers of differences approaches. The empirical material gathered for the analysis involved narrative interviews with eight heterogeneous women, associated with the regional organization Café Mulher, in the South Region of Minas Gerais, and documentary research. This material was analyzed using Thematic Content Analysis and the use of the analysis lens of the postcolonial approach and the intersectionality of social markers of differences. Three categories of analysis emerged: who are the women associated with the regional organization Café Mulher; the context of the referred organization and the power relations between the associated women. The results lead us to interpret that the women associated with Café Mulher are heterogeneous women, contrary to the universal concept of “woman”. They are women of different colors, professions, such as coffee growers, collectors, pickers, sharecroppers and social classes, who are in coffee farming from 16 to 50 years old and have a very strong family and/or individual involvement with coffee. From the intersections between the social markers of differences, these women occupy different positions in the rough terrain of the regional organization Café Mulher. Souza and Ana, mother and daughter, black women, poor, collectors and collectors, born and raised in the Distrito de Lutas, in the midst of structured power relations still in the slavery period, were identified by us, among the interviewees, as the associates who they are at the crossroads of oppressive sexism, racism and elitism, being hit by an intense flow of traffic that leaves serious marks. Regarding the context of the regional organization Café Mulher, it was founded in the Distrito de Lutas, in 2015, by Maria and Auzira Amélia, white women, coffee growers, owners of their farms and from the upper-middle class, with the aim of helping the collectors, and sharecroppers in the District, however, did not lose focus on the marketing and excluding logic, in reality, aimed at the producers. This objective, therefore, was lost and Café Mulher became a context for reproductions. When black women, who are collectors and collectors, began to hold power, show their resistance and have their voices heard and their presence known, the coffee growers felt uncomfortable, after all, I hurt the narcissistic pact of whiteness. With the creation of Comercializadora Café Mulher South Region of Minas Gerais, linked to Café Mulher, it was no different, the focus is on the capitalization needs of coffee producers. In this context, therefore, the reproduction of power relations between women prevails, mediated by the intersection of ways of oppression such as racism and elitism, which, since the colonial period, seek to keep power in the hands of white people, coffee farmers and owners of their land, placing black, poor women, collectors and gatherers in a subordinate condition.